quarta-feira, 20 de maio de 2015

Texto dois


Ser, mundo, evento.
em seus olhos, vejo minha perda escrita
racine
Fazer do futuro uma recuperação do passado, uma vitória após uma seqüência de batalhas, “de derrota em derrota ate’ a vitória final”, como disse Mao, e’ possível somente na medida que não apenas vemos, mas também desejemos esta vitória.
Nesta disputa, o passado não e’ uma saudade melancólica, um acu'mulo de acontecimentos vazios e objetos fetiches, mas um receptáculo de projetos desperdiçados, onde presentes nas suas ruínas e partes desconexas podem estar as esperanças e os sonhos de uma emancipação radical da humanidade.
Mas onde estarão as verdadeiras, legitimas peças do patrimônio histórico coletivo, a serem usadas e transformadas?
Quais as formas, em suas perenidades, na sua pulsão de morte, na sua incrustação no solo original, quais as formas a serem mixadas, na carnavalização revolucionária, em uma imposição  de um novo mundo?
Um novo mundo que desvele as suas aparências particulares e neste intervalo vazio permita gerar novos nomes e lugares, ocupar falas  que “ trarão `a vida o mundo desconhecido que esta’ a nossa espera porque esperamos por ele
Mas e se o futuro ao qual se deve ser fiel for o futuro do próprio passado, em outras palavras, o potencial emancipatório que não se realizou por causa do fracasso das tentativas passadas  e, por esta razão, continua a nos perseguir?” diz Zizek, e o excesso do entusiasmo revolucionário e’ portanto, o de um futuro do/ no passado, “um evento espectral que aguarda sua encarnação apropriada.”
Neste ponto, Slavov Zizek recorre `a elaboração de Deleuze sobre a repetição como a forma do surgimento do novo, ou como Alain Badiou, quando desenvolve o conceito de ressurreição, como uma destinação subjetiva de um evento, uma reativação de um acontecimento cujos traços foram obliterados ou apagados, onde “ todo sujeito fiel pode reincorporar `a sua presença evantal um fragmento da verdade, que foi enterrada por baixo da barra da ocultação” . E’ esta reincorporação que ele chama de ressurreição.
Recolher, separar, deixar valer uma memória que não se submeta `as ordens imperiosas do arquivo e da história oficial, recuperar uma memória ancorada nas falas abafadas, nas fluidas transmissões orais, dos incessantes fazeres e cantos, uma memória de muitas festas e paixões, onde os pequenos acontecimentos se movimentam nos estreitos vazios da dura cidade.
Mas como escolher?
Haverão traços que ultrapassem, hoje escondidos, antes soterrados,  a essência dos lugares, a origem e começos desta segunda natureza que nos abriga e nos engana?
Que nos ama e nos entristece.
maio.2015