domingo, 4 de dezembro de 2011

Surpresas


Da arquitetura e das cidades temos duas experiências: uma vulgar, do repetido mundo cotidiano, quando passamos distraidos e nem percebemos as coisas, "vc passa por mim e nao olha", e uma outra excepcional, surpreendente, maravilhosa, sublime, quando nos apaixonamos ou nos surpreendemos com um lugar, uma construção, um ambiente artificial ou uma paisagem natural.
Entre estes dois extremos ou limiares humanos,  a vida e a natureza transcorrem impassíveis nas suas finitudes, multiplicando prazeres e dores, indiferente ao tempo e as coisas dos mortais homens e de suas particularidades, imutável diante de suas idiossincrasias, de seus desejos insensatos e de suas mortes, pouco se alterando no ritmo de seus largos e longos séculos.
Nossos corpos, sensíveis e mortais, limitados nas suas percepções e tamanhos, acumularam pertences em suas histórias, desde que nos assentamos sobre a terra e delimitamos os nossos territórios, registraram marcas e cicatrizes, adquiriram modos, gestos e significados que marcam a nossa presença no mundo, racionalizaram comportamentos e repetiram gestos e convenções.
Dentro e fora, em cima, nos etéreos céus, ou embaixo, nos infernos ígneos, nas frentes e nas costas, perto e longe, na finitude ou no infinito de nosso olhar e da nossa capacidade de movimento, fomos adquirindo  e construindo muros e portas, coberturas e janelas, anotando as partes, apontando os centros e as vastidões de caminhos e estradas. 
Juntos em disputas, conceitos e concretos, viraram cidades e lugares, casas e palácios, que duraram séculos, mas também deixaram ruínas, abandonados templos, despedaçadas armacoes  de pedras e cal.
    
Permanências e transformações acompanham as inúmeras civilizações e culturas, sobrepondo artefatos e experiências, mixando atos e e representações, violentamente, em conflitos e guerras, ou em amistosos encontros aleatórios e furtivos romances.

sábado, 19 de novembro de 2011

Quando Adão cavava e Eva fiava.


E a natureza, em comunhão com os homens, distribuía os seus frutos em profusão, sem nenhuma distinção ou usura, com os seus múltiplos verdes cobrindo as matas, e os rios escorrendo suas aguas cristalinas por entre os campos em flor.
Felizes e plenos, os homens anunciavam nomes e mais nomes para cada nova criação, designavam lugares e apontavam direcoes e pontos cardeais, e para cada lado ou destino, o caminho escolhido era sempre a melhor escolha e opcao.
Sem prejuízos e dores, o trabalho era leve, o alimento era farto, saudável, constante e o tempo aprazível e temperado, mesmo quando as chuvas irrigavam, sob as múltiplas cores do arco íris, as plantações e os pastos, onde os animais e as aves faziam seus ninhos e protegiam as suas reproduções.
Nos altos das montanhas, rolavam nuvens brancas, enfeitando o perfil do horizonte.
Quando Adão cavava e Eva fiava.


quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Medo e esperança na política



Viver sob o medo e na esperança e’ viver na dúvida quanto ao porvir humano. Entre o medo da morte e a esperança de vida, se configuram duas vias para a instituição do político, conforme o medo seja mais forte ou a esperança sobreponha o medo. 
Existem dois medos. 
O medo animal da solidão que leva os homens `a cooperação imposta, através da regulação legal e da violência e o medo virtuoso dos cidadãos que leva os homens `a vida em comum, através do amor e da política.
A finalidade da política, segundo Espinosa e’ a liberdade e a segurança. Visto que a segurança e’ o aparato jurídico e policial, obtida através e por meio da repressão dos cidadãos e externamente através da guerra, normalmente opomos liberdade e segurança, livre arbítrio e contingência. 
Porém a soberania política só e’ possível na segurança coletiva, que pressupõe a desaparição do medo e da esperança, ambos marcados pela dúvida e instabilidade. A autonomia e segurança pressupõe a capacidade de não nos submetermos `a contingência cega, não se opondo  necessariamente `a liberdade pessoal e publica.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Estrelas


Ha’ momentos em que os homens sao senhores do seu destino.
 O erro, meu caro Brutus, nao esta’ em nossas estrelas , mas em no’s mesmos.
Julio Cesar. 
Shakespeare

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Desarmado


“Por que ruas tão largas?
Por que ruas tão retas?
Meus passo torto
foi regulado pelos becos tortos
de onde veio,...
Aqui tudo é exposto
evidente
cintilante. Aqui
obrigam-me a nascer de novo, desarmado. “

Carlos Drummond de Andrade
In Esquecer para lembrar.






postei esta poesia em 8 de marco de 2011

Guardados

Algum tempo, as ruinas.
Que exista o que existe, em partes, fragmentos.
As totalidades se esvaem nestes inúmeros riscos e
materias pesadas,
onde por entre as suas fraturas e desvios se movem
os ventos,
lentas aragens e a graciosa curva do mar.

domingo, 2 de outubro de 2011

Tentação 1



A tentação identitaria ou “a desrazao identitaria” como diz Jacques Le Goff, consiste em um deslocamento coletivo que conduz da flexibilidade tolerante, de uma apropriada manutenção de si na original promessa, para uma rigidez inflexível de carater local, cultural ou de classe.
O segundo movimento desta tentação e’ o confronto da identidade inventada com a de uma outra, estrangeira, percebida como uma ameaça, como um perigo para a identidade própria, tanto a de no’s como a do eu, e assim, passamos a temer e a nao aceitar outros modos de levar a vida, de manifestar o conhecimento e a cultura, e rejeitar maneiras diferentes das nossas falas.

A terceira atitude e’ fruto da herança da violência fundadora, pois o que celebramos como eventos originais sao essencialmente atos violentos, legitimados posteriormente, no limite, por sua própria antiguidade, ou pela forca da lei, se manifestando como uma glo’ria para uns, vencedores, mas como execração dos outros, de todos os vencidos.

domingo, 25 de setembro de 2011

Memória e esquecimento.



Aqui tudo é exposto
Evidente
cintilante. Aqui
obrigam-me a nascer de novo, desarmado. “
Carlos Drummond de Andrade

Na obra de Marcel Proust a poética do esquecimento e’ ao mesmo tempo uma poética da lembrança, uma poética de lembrar surgida do fundo de esquecer. Assim  sempre e’ preciso uma “ dosagem exata de memória e esquecimento” para que a pessoa tenha o dom da lembrança, para que se arme, se estruture uma memória poética.
Mas, “ Só quando o esquecimento perdurou um tempo suficiente e se tornou bastante profundo, a memória involuntária pode agir e trazer  fundo desse abismo do esquecimento, sem o controle de parte da razão e da forca da vontade,…(re) fazendo um processo que se origina “ Da memória banal voluntária pelo esquecimento profundo e duradouro ate a memória poética involuntária…, se transformando como o novo e para a constituição de “ uma faculdade que serve muito bem `a vida.”
A memória poética,“ Ela cura dos medos do tempo e da morte e traz felicidade aos seres humanos que a ela se confiam.”
Seremos assim capazes de nos reconciliar, com o todo, com o não dito, com o perdido paraíso, onde segundo Dante :
A partir de agora minha visão era ainda maior
Do que nossa linguagem que não estava `a altura,
E a memória cede lugar ao inaudito.

Onde abandonado o esquecimento, abandonadas a escravidão e a dor, possamos nos reencontrar com a aliança e com o acordo original com a divindade:
Será, pois, que, quando o SENHOR teu Deus te tiver dado repouso de todos os teus inimigos em redor, na terra que o SENHOR teu Deus te dá por herança, para possuí-la, ......; não te esqueças.
Não esqueças o Senhor que te tirou do Egito, da escravidão.
DEUT 25, 19

Neste momento, possamos cumprir dever maior da memória, de ao lembrar fazer justiça, testemunhar para o que foram calados, cujas historias foram esquecidas, enterradas as suas ruínas e eventos, pois segundo Aristóteles:
O dever da memória e da herança e’ o dever de fazer justiça, pela lembrança, a um outro que não a si.”
Somos devedores aos que nos precederam, uma divida que não se limita a guarda e preservação dos seus rastros e partes sobreviventes, do duro material ou ao leve escrito, mas a um sentimento de dever aos outros, de submeter a herança a um inventario, com uma prioridade moral `as vitimas, outras que não foram no’s.

Na Lisboa de Fernando Pessoa:
Fica só, sem mim, que esqueci porque durmo,
Lisboa com suas casas
De várias cores.

e na triste mas esperançosa poesia de Cesário Verde:
Nas nossas ruas, ao anoitecer,
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer

E, enorme, nesta massa irregular
De prédios sepulcrais, com dimensões de montes,
A Dor humana busca os amplos horizontes,
E tem marés de fel como um sinistro mar!

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Na matéria das pedras


Nas cidades, há uma convivência de duas séries, do presente e do passado, onde as  coisas habitam simultaneamente as duas. 
Eduardo Gruner, em uma leitura de Walter Benjamin, diz: La arquitectura es el arte que más intensas y dramáticamente conserva la memória arcaica de las necessidades primarias de la espécie”. Para ele, a arquitetura é o lugar onde se desnuda a contradição, onde se expõem os conflitos entre os desejos  arcaicos da humanidade, o desejo de reconciliação entre a natureza e o mundo e a realidade da alienação capitalista, do fetichismo da mercadoria, onde “ da impossibilidade do cumprimento cabal desta promessa de reconciliação”. 
Na arquitetura e na cidade, em ruínas superpostas, não basta a presença de uma memória cri'tica, mas é necessário um choque, “um curto circuito com a infelicidade do presente”, para a constituição da memória antecipada do futuro redimido. E' preciso uma memória que desperte a nostalgia do que nunca existiu e a projete em direção a uma redenção futura através de uma mimesis transubjetiva.
Em algum momento, os objetos arquitetônicos participaram da feitura de um tempo, abrigaram eventos, práticas, prazeres e dores, imprimiram em seus muros valores e significados de uma época e de uma cultura. O que continua, o que resta, tentando informar um sentido cósmico à natureza e à phisis, à cultura e arte, o que resta do que se esvai e se abre, se esconde ao compartilhamento, à tradução, à tradição, estão suportados em registros construídos, para serem desvelados, em sua aparência quotidiana, nas cidades, nas suas sombras e luzes, aos futuros ocupantes. 
Ali, impressos na matéria das pedras e na ordem da formas, retém-se, para a interpretação e potencia, acumuladas por décadas e séculos, uma massa de informação, onde a superposição histórica foi as misturando, contíguas e superpostas, que ao primeiro olhar, curioso de possuí-las e organizá-las se segue imediatamente uma sensação de desconforto e desanimo. 
Como se não fosse possível desvencilhar os fios e tramas que as compuseram, ou, que quando possível, apenas se apresentasse à contemplação e`a leitura um texto ininteligível que nenhum código, por mais complexo ou universal, fosse capaz de recuperar parte ou a totalidade de seus sentidos originais. 



domingo, 8 de maio de 2011

Esplendor na relva

A luz que brilhava tão intensamente
Foi agora arrancada dos meus olhos,
E embora nada possa devolver os momentos
Do esplendor na relva e de glória das flores
Não sofreremos, melhor,
Encontraremos força no que ficou para trás.

Wordsworth


domingo, 10 de abril de 2011

Transparente e leve


A brisa e o vento, transparentes e leves, revelam o embate de dois sentimentos, do que se mantém estático e do que se transforma e que se realiza, na oposição da gravidade e da graça.
A gravidade, através do peso e da massa, qualidades fundamentais da matéria, tanto natural como construída, suporta e fixa as coisas permanentes da cidade e do mundo.
A graça, em sua leveza, é a experiência dos mistérios, da fragilidade das mudanças, do acesso a seus encantos e fantasmas, quando, diz Lampedusa, “ Sob o fermento de um sol intenso, todas as coisas pareciam perder o peso”.
Observar as formas e matérias urbanas, sobre este duplo olhar de admiração, nos faz compreender a sua permanência e a sua fluidez, a sua continuidade e a sua mudança, a sua identidade e suas diferenças, oposição clássica do ser e das suas histórias e interpretações, pois, diz Marilena Chauí “o que causa admiração e melancolia é a perpétua instabilidade das coisas, sua aparição e desaparição, o nascimento e a morte, a geração e a corrupção dos seres”.
No mundo sensível, dos elementos materiais que sustentam a continuidade na unidade do ser, são as mudanças que alimentam a curiosidade dos que querem entender o nascimento e morte dos homens e de suas criações, que querem viver as transformações que alteram a face do artificio e da natureza, que querem descrever as paixões e os conflitos que atingem a sociedade e movimentam os acontecimentos históricos.
Que novidades, hoje, trazem e circulam estes ventos e brisas, instantâneos e etéreos?
Novas pestes globais que não obedecem a fronteiras, saltam os limites de países e avançam sobre cada corpo desprotegido, inoculando a solidão, o sofrimento e a melancolia?
Ou serão eles como brisas saudáveis que, originárias de outros mares, trazem as notícias recentes do coração do mundo, carregando as novas e expondo ao uso humano, expandidas e potenciais interações sensíveis?
Eugene Montale nos anuncia um vento tão especial que soa como lâminas, em sua poesia Corne Inglês.
O vento que esta tarde faz soar diligente
__ lembra um ruidoso sacudir de lâminas__
os instrumentos das arvores copadas e varre o
o horizonte de cobre
onde rajadas de luz alongam
como pandorgas no céu que ribomba ...
e o mar que escama por escama,
lívido, se matiza,
lança à terra uma tromba
de espiraladas espumas;
o vento que nasce e morre
na hora que lenta escurece
pudesse ele esta tarde fazer-te soar também
desafinado instrumento,
coração.
Será possível conviver, peso e leveza, corpo e espírito, comungando neste artifício monstruoso e belo, nestas cidades dos homens e deuses, que não mais cabem em suas muralhas e ocupam cada pedaço da terra, e outros sentidos de vida coletiva?
Ambigüidades ocupam estes ventos virtuais.
Ao se deslocarem, instantaneamente, não pressionam os corpos e a atmosfera, deslizando por fibras óticas, por ondas, em oscilações tão finas e complexas que só a máquina matemática consegue decifrar as suas intenções. Os muros e paredes não são obstáculos, não alteram as suas direções ou interferem nos seus caminhos e pouco podemos perceber as mudanças que produzem e as portas que batem e se deslocam.
Mas também são como sopros homogêneos, repetindo a exaustão, sobre os corpos desprotegidos, a mesma e idêntica ordem, desqualificando o sensível e o tátil trocados pela interface da tela sem profundidade, igualando vontades e apetites que se encerram no imediato instante de suas satisfações.
Poderão conviver e somar, pedras e bits, conectados em pontos de interface, ou se oporão, matéria e virtual, em mundos estanques e estrangeiros, com seus próprios desígnios e valores, tentando impor seus modelos únicos de vida e indiferença?
Em ambos os circuitos, às permanências acumuladas tentam se opor ao esquecimento e a perda.
È insuportável manter cada e todo registro das coisas, acumulando-se em camadas sobre as fachadas e pisos, grudando-se a cada instante o novo e outro e mais, se imprimindo sem fim nos muros e pedras engrossadas de tanta informação.
Bom são as coisas que viram pó. Levadas pelo tempo e pelas intempéries desgrudam-se de seus suportes e volteiam pelos ares, não se agrupando em novas ordens e formas, mas deixando-se levar desgarradas até que nem o brilho do sol consiga mais captar as suas desaparições no final da tarde, quando as sombras ombreiam as luzes contra as montanhas e os sobrados da velha cidade.
No espaço virtual, ao contrário, parece não haver desgaste, se concentrando cada caso, em sua inutilidade, em fiéis arquivos que vão se multiplicando em bancos e memórias sem limites.
Nestes lugares da memória instrumentalizada, ficam instalados nossos menores gestos e movimentos aguardando o olhar investigador, que tentam devolver à vida, o 

terça-feira, 8 de março de 2011

Desarmado



“Por que ruas tão largas?
Por que ruas tão retas?
Meu passo torto
foi regulado pelos becos tortos
de onde veio,...
Aqui tudo é exposto
evidente
cintilante. Aqui
obrigam-me a nascer de novo, desarmado. “

Carlos Drummond de Andrade
In Esquecer para lembrar.

segunda-feira, 7 de março de 2011

“E qual é a medida dos meus dias?” salmo 38,5



Em uma cidade de Vitoria de tantos fracassos e projetos abortados em seus 460 anos de história provinciana, registradas em suas ruínas e nas falas de seus fantasmas, mais um futuro incerto se apresenta, agora de feito virtual, na sua articulação global, submetido às ordens do capital e das lógicas do mercado.


Poderemos superar este destino e nesta oposição cidade/mundo, vazadas as barreiras e fronteiras às imateriais e instantâneas ações e pensamentos, acelerados os movimentos dos corpos, bens e informação, e propor e viver a alegria e o prazer da finitude humana?
Começarei por um texto anotado ao acaso:
Estes dias não tem um ser verdadeiro;
Eles vão quase antes de chegar;
E quando vem, não podem continuar;
Comprimem-se uns contra os outros, seguem uns aos outros e não são capazes de interromper o próprio curso.
Do passado, nada é reconvocado;
O que é esperado é algo que há de passar novamente;
Ainda não é possuído, enquanto não tiver chegado;
Não pode ser capturado, depois que chega.
Este texto, que poderia ser tão atual, diante dos tempos que vivemos, é de Santo Agostinho, em Cidade dos Homens, quando se pronuncia diante do mundo antigo em transformação, de um império romano em colapso, no século IV:
Pergunta, como o salmista em Salmo 38,5:
 “E qual é a medida dos meus dias?”
E completa, na sua fé e esperança cristã:
“Eu anseio, por esse È que fica na Jerusalém, onde não haverá morte, onde não haverá fracasso, onde o dia não há de passar, um dia que não é precedido de um ontem, nem expulso por um amanhã.
Essa medida dos meus dias, o que é, digo eu, revela-te a mim.”
O desejo e’ da unidade, impossível, mas que precisa ser desejado como possibilidade na presença de um mundo em dissolução, onde nada é reconvocado, nada é possuído, onde a violência é o horizonte temporal da errancia, que aceita que uma promessa não se cumpra, um programa não se execute, como um movimento puro, uma fraternidade sem destino.
Violência, ausência, errância.
O poeta Paul Celan nos aponta uma potência:
Escrita estreita entre muros
Impraticável verdadeira
Esta
Ascensão e volta
No futuro claro coração.
Há um caminho, uma senda estreita entre muros, mas verdadeiro que seja, é impraticável, mas pensável.
Ali, nesta limitada passagem, onde valia a violência, sem destino ou fins, aparece, no limiar, a diferença mínima do alento do outro. 
Mas como fazer nossa esta alteridade?
A dificuldade primeira é que não existe um caminho já explorado, nada pré existe, nada antecipa esta tentativa, estamos sozinhos “diante do não navegado”, onde é preciso empreender a “ascensão e a volta”, que requer a voz e a presença do outro.
Este é o desafio.
Atuar no risco do movimento incessante, onde as posições se adquirem e se estabelecem, instáveis, através da circulação, dos bens, da informação e das pessoas, em um incessante conflito com o que se estabelece nos lugares pela transformação da matéria bruta pelo trabalho humano.
Atuar no risco da ação que se define, se altera se (re) conceitua no processo permanente de negociação coletiva, na feitura dos projetos, no desenho e na execução dos caminhos sem fins. 
Atuar no risco dos conflitos, na mobilidade dos acontecimentos, na diferença, no estar juntos e separados, espacialmente e socialmente, na disputa da riqueza material e simbólica, dos espaços e sítios. 
Atuar principalmente no tempo, para salvar o efêmero e o instante, contra o que tudo dissolve, contra o que tudo interrompe, contra o que tudo escapa e se desmancha no ar, por entre os ventos e brisas. 
Encerra Celan;
Do visível, do audível, a
Palavra tenda 
Que se libera:
Juntos.

sábado, 5 de março de 2011

O dever da memoria

Será, pois, que, quando o SENHOR teu Deus te tiver dado repouso de todos os teus inimigos em redor, na terra que o SENHOR teu Deus te dá por herança, para possuí-la, ......; não te esqueças.
DEUT 25, 19
“O dever da memória e da herança e’ o dever de fazer justiça, pela lembrança, a um outro que não a si.”
Aristoteles

Somos devedores aos que nos precederam, uma divida que não se limita a guarda e preservação dos rastros e partes sobreviventes, material ou escrito, mas a um sentimento de dever aos outros, de submeter a herança a um inventario, com uma prioridade moral as vitimas, outras que nao no’s.

Outros que nao no's.
Fica só, sem mim, que esqueci porque durmo, 
Lisboa com suas casas 
De várias cores. 
Alvaro de Campos